DO PESO E DA LEVEZA

O ensaio aborda a linguagem poética em função da dualidade peso-leveza, com plena consciência do carácter oscilante (quase sempre metafórico, no uso comum) que informa qualquer dos termos, e assumindo o ponto de vista dos cépticos sem certezas, mas abertos à busca de pensamentos instáveis e potencialmente produtivos. O que move o autor não é tanto o peso ou a leveza do real ou do Ser (que não poderão deixar de se perfilar no horizonte, como acontece desde os filósofos pré-socráticos), nem sequer da criação artística em geral (que aqui é objecto de uma demanda particular, com os exemplos de artistas como Mark Rothko, os portugueses Rui Chafes e Ilda David, e as fotografias de Maria Etelvina Santos), mas antes a densidade leve, ou a leveza densa, da palavra ‘daqueles que adensam a palavra’ – que é a tradução literal do nome do ‘poeta’ (Dichter) numa língua como o alemão, e que aqui assume epecial pertinência. O fio condutor, apoiado pela filosofia da linguagem e por alguma teoria poética, é um poema longo de Hölderlin cuja versão portuguesa, só por si, permitirá sustentar as ideias que o ensaio pretende transmitir a propósito do peso e da leveza na criação poética, escrita e dita – porque o texto dito é impulsionado por uma energia muito própria, que confere desde logo densidade ao signo poético, libertando-o, por outro lado, do peso (morto, afirmam alguns) da palavra fixada na escrita (ou da ‘coisa mental’ do pensamento). E assim ele ganha uma outra leveza, asas que não são necessariamente as da palavra efémera, contradizendo o dito latino do ‘scripta manent, verba volant’. Porque aqui, no poema escrito e dito que nasce do corpo para ir habitar outras regiões, a palavra é voz, e a escrita dos que ‘adensam a palavra’, e a elevam a potências tantas vezes inimagináveis, trabalha com a matéria leve das imagens e das figuras, para fazer da palavra poética, que tem corpo concreto e é sempre presente, matéria etérea e futurante.