DA SOBERBA DA POESIA

A literatura e a arte têm ainda alguma chance de exercer seu arbítrio político? ‘Da soberba da poesia – distinção, elitismo, democracia’ busca retomar essa questão, a partir de sua contemporaneidade. Partindo de polêmica contemporânea – na qual o artista Nuno Ramos responde ‘à violência e à intimidação’ da opinião pública, a propósito de obra exposta na 29ª Bienal de São Paulo – o ensaio procura evidenciar o fato de que o episódio não é pontual, mas característico da situação moderna da literatura e da arte. Ocupando regularmente o banco dos réus do ethos democrático, a ‘soberba’ e o ‘arbítrio’ da arte fazem parte do horizonte último de sua relação com a história. Em outras palavras, a soberba é um dos aspectos estruturantes do conflito moderno entre poesia e sociedade e a reivindicação do direito ou da prerrogativa da soberba tem sido duramente combatida pela história literária como ‘esteticismo’, ‘hermetismo’ ou ‘idealismo’. Distinta do pecado ou da húbris política, aos quais é tradicionalmente associada, para Marcos Siscar, a soberba seria o nome moral do sublime estético, uma atitude histórica relacionada ao sublime. Para reconstituir o estado moderno da questão, o autor deve recorrer a um texto de juventude de Mallarmé. A ideia que emana do tratamento da soberba como figura de um discurso político é a de que o controle moral da distinção poética é um elemento constitutivo da experiência da democracia. Para o autor, ao invés de se opor ao conteúdo político da discussão, seria preferível reconhecer aquilo que, na trajetória moderna da poesia, já indicia um pensamento sobre a democracia e sobre a possibilidade da soberania artística.